O novo professor, Leôncio, era moderno, musculoso, bem feito, bigode sempre nos trinques, roupa engomada, sapato brilhando, fala mansa, gentil, religioso, moralista. Era o homem que toda mulher queria ter. Por onde passava, suspiros voavam. Não negava conversa com nenhuma mulher, sendo elogiado pela maneira delicada com que atendia a todas, com um sorriso enorme.
Quincas, dono da bodega, era o felizardo do povoado, com a mulher mais vistosa. Todos perguntavam: “Como é que um homem feio e desajeitado desses consegue manter uma mulherzona daquelas?
A resposta era sempre a mesma, com um sorriso:
- Cabresto curto. Muito curto.
Numa segunda feira, Leôncio chegou à bodega, levando uma ovelha, deixando todo mundo admirado. Foi logo pedindo:
- Seu Quincas, daria para o amigo guardar essa carneirinha por meia hora? Já está com cabresto.
- Claro! A meia hora vai virar uma hora, ou não?
- Meia hora é meia hora, seu Quincas, sem atraso.
O bodegueiro amarrou a carneirinha no quintal, enquanto o homem ia embora assobiando. Fez o que tinha que fazer, voltou, pegou o animal e foi-se embora.
Na semana seguinte, segunda-feira, voltou Leôncio, com outra ovelha:
- Seu Quincas, por gentileza, poderia guardar essa marrãzinha por duas horas?
- Claro! Duas horas que viram três, ou não?
- Não, seu Quincas, duas horas são duas horas, na certeza.
O bodegueiro amarrou a marrãzinha no quintal, enquanto Leôncio saiu assobiando para fazer o seu negócio na praça..
Na outra semana, segunda-feira, Leôncio aparece de novo:
- Seu Quincas, por acaso o nobre amigo ainda tem paciência e poderia guardar essa ovelhinha por duas horas e meia?
- Mas, claro que sim! Duas e meia que vão virar três?
- Não, seu Quincas, vão ser duas e meia, no duro.
O bodegueiro amarrou a ovelhinha no quintal enquanto Leôncio saía assobiando em direção à Igreja central.
Na próxima semana, segunda-feira, Leôncio reapareceu:
- Seu Quincas, se bem lhe conviesse, o amigo não ficaria preocupado em guardar a marrãzinha por um tempinho, três horas?
- Claro! Três horas que vão virar quatro?
- Não, seu Quincas, fique tranquilo que serão três, mesmo.
Dessa vez, Quincas ficou curioso. Onde será que o homem ia? Pagar contas? Rezar na igreja? Visitar algum doente? Visitar algum preso? Dar aula para algum aluno atrasado? Não bebia, não fumava, era educado e gentil, gente fina. Mas tinha, com certeza, um segredo em toda segunda-feira. E por que essa ovelha, toda segunda-feira?
Matutou, matutou, não entendeu, mas resolveu passar a limpo, no próximo encontro.
Não demorou, pois na segunda-feira, eis o Leôncio surgindo, com uma bela marrã na corda:
- Seu Quincas, com as bênçãos de Deus, o amigo poderia guardar essa ovelha, por três horas?
- Claro, professor, pode deixar e já sei que o amigo é pontual, mesmo.
Amarrou a ovelha no fundo do quintal, enquanto o professor ia caminhando em direção à praça. Quincas chamou, depressa, o ajudante:
- Pegue esse pacote de linguiças que é para a Da. Lurdinha. Mas antes de entregar, você vai seguir o professor Leôncio. Quero saber onde ele vai.
Assim foi feito; o ajudante voltou e ficou amuado, trabalhando, meio se escondendo.
À tarde, Quincas lembrou-se do caso e perguntou ao ajudante:
- E então, você seguiu o professor?
- Sim.
- Viu em qual lugar foi?
- Sim.
- Era a Igreja, Fórum, Cadeia, Sindicato, Escola, onde foi?
O ajudante não quis responder, olhava para os cantos, engolia em seco, sem jeito.
- Pois diga, homem, aonde foi o professor?
- Xii - balbuciou bem baixinho - ele entrou na sua casa, patrão!
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