Ovelhas da raça Santa Inês podem ser utilizadas com sucesso em programas de cruzamento voltados exclusivamente para a produção de carne. A diferença entre outras raças consideradas “especializadas” (Suffolk, Texel, Ile-de-France) está no fator “antrópico”.
A explicação está na interferência do homem que possibilitou o melhoramento genético aos animais com um único propósito: produzir carne de qualidade. A raça Santa Inês, no entanto, continua em “observações”, mas nem sempre de natureza zootécnica. A ela, ou a qualquer outra ovelha deslanada, atribuiu-se o dever de suportar diversidades climáticas e biomas como os da caatinga, pantanal e cerrado, e de produzir sob qualquer circunstância, seja na seca, na chuva, etc. Tal atributo, no entanto, não é cobrado tão veementemente de matrizes das raças consideradas “especializadas”.
Muitos criadores, principalmente do Sudeste e Centro-Oeste, adotam como modelo de produção a importação de fêmeas deslanadas do Nordeste, para cruzamento. A maioria destes criadores é egressa de outras atividades agropecuárias e, portanto, neófitos e inexperientes sobre o manejo dos ovinos. Nessas circunstâncias, pode haver um elevado índice de mortalidade dos animais jovens e de doenças nos adultos.
Levando em consideração fatos e estudos, ovinos de raças deslanadas e seus mestiços são mais resistentes ao estresse causado pelo ambiente tropical, porém, susceptíveis a doenças como pododermatite e helmintoses. Pastagens muito úmidas, forrageiras inadequadas e de baixo valor nutritivo, dietas mal balanceadas e instalações mal planejadas que não ofereçam segurança, conforto e higiene apenas colaboram para o mau desempenho dos animais. Outros fatores, como o estresse, também são prejudiciais aos animais.
O transporte – Muitas vezes, o estresse dos animais está associado à forma de transportar e ao período de adaptação dos animais ao novo habitat. Superlotação, viagens longas, chuva, frio ou calor intensos podem induzir síndromes gastroentéricas, levando os animais à morte durante a viagem ou dentro de cinco dias após o desembarque.
A quarentena – É imprescindível que os animais recém-chegados fiquem de quarentena antes de serem ingressados ao rebanho, recebendo alimentação fresca e leve, água à vontade, sal mineralizado e conforto térmico e espacial. Nesta ocasião, inicia-se o programa de vacinações e dosificações anti-helmínticas específico para a propriedade. Quando o lote em observação começar a ganhar peso e recuperar sua condição original, aí sim ele poderá ser envolvido no manejo da propriedade. A atenção, portanto, deverá ser dobrada, pois os animais mais sensíveis aos parasitas irão manifestar a doença e, rapidamente, deverão ser tratados.
Após quarentena, os ovinos deslanados, sobretudo o Santa Inês, adaptam-se perfeitamente ao clima do cerrado e da mata atlântica, que compõem as regiões Sudeste e Centro-Oeste. As áreas de muita chuva e temperaturas muito elevadas, como o litoral, requerem cuidados especiais, pois o ambiente favorece a infestação de vermes, podendo prejudicar a rentabilidade da exploração.
Ovinocultura no Sudeste
No Sudeste, embora a produção de carne ovina ainda não atenda à demanda, a atividade tem se mostrado viável e lucrativa. O mercado está crescendo e a tendência é que a ovinocultura torne-se cada vez mais comum na região.
Para que os produtos não percam a qualidade, pesquisadores da Embrapa Pecuária Sudeste, sediada em São Carlos (SP), realizaram cruzamentos com reprodutores de aptidão para carne, aplicando manejo que permitisse atingir altas taxas de prolificidade, de parição e de sobrevivência dos cordeiros. Os animais foram vermifugados e avaliados pelo método Famacha para complementar os resultados de um hematócrito (aparelho destinado a separar e contar os glóbulos vermelhos de determinada quantidade de sangue) e de exame de fezes para controle da verminose (OPG). A alimentação foi adequada para cada categoria (cordeiros, ovelhas no periparto, animais em acasalamento), garantindo o fortalecimento do sistema imunológico dos animais e auxiliando na prevenção de doenças.
O sistema adotado utilizou 120 ovelhas deslanadas Santa Inês puras e cruzadas, acasaladas com carneiros da mesma raça, Dorper e Suffolk. O objetivo deste trabalho era avaliar o desempenho dos cordeiros em confinamento.
As matrizes foram mantidas em 3,5 hectares de capim Aruana, sob manejo intensivo (adubação) e rotação de pastagem, em piquetes de 3 a 4 dias e período de descanso de 24 a 32 dias. Na época seca, matrizes e crias “ao pé” foram suplementadas a pasto com silagem de milho. Água e mistura mineral foram fornecidos à vontade durante todo o período experimental. As crias tiveram acesso ao cocho privativo e foram desmamadas entre 17 e 20 kg de peso vivo e engordadas em confinamento, até atingirem o peso de abate (38 kg). A estação de monta teve duração inferior a 51 dias. Neste sistema, a taxa de parição atingiu 92,5% e a prolificidade média foi de 1,5 cordeiro/parto. Os cordeiros 1/2 Dorper e Santa Inês apresentaram-se mais pesados ao abate (37,4 vs. 35,8 kg) e mais precoces em relação aos demais. Os produtos machos Santa Inês apresentaram características de carcaça superiores, de modo que não houve diferenças significativas entre os cruzamentos para os diferentes cortes da carcaça e também para a porção comestível, retalhos, ossos e sebo.
Os resultados preliminares indicaram que há menor conteúdo em ácidos graxos na carne das crias de Santa Inês, isso significa que a carne apresentou-se mais magra.
Rui Machado - médico veterinário e pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste.
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