Atualmente, um dos principais objetivos do pastoreio é interagir plantas e animais que possam resultar em bons produtos finais. Durante o pastoreio, os animais podem deparar com alimentos que diferem de sua aceitabilidade e, em conseqüência, passam a consumir esses vegetais de várias espécies de forma diferenciada.
Este mecanismo pode afetar tanto o estado nutritivo do animal como o processo sucessório nas comunidades vegetais. Contudo, a capacidade que os herbívoros exibem de utilizar a vegetação pode variar de acordo com determinados fatores, entre eles a espécie animal, a estação do pastoreio, a carga pecuária e o período do dia. Dentro deste contexto é possível quantificar as possíveis diferenças na forma de os caprinos usufruírem a vegetação, segundo a densidade de carga e a estação do pastoreio.
Experimento
Para tanto, um trabalho foi realizado em uma campina repovoada com pinus nigra Arnold sobre o solário do Valle de la Garcipollera (Huesca, na Espanha). A vegetação do cerrado apresentava um nível de recobrimento arbustivo de 37%, sendo a aliaga (genista scorpius (L.) DC.) e o buxo (buxus sempervirens L.) as espécies predominantes. Em menor quantidade havia endrino (prunus spinosa), rosal silvestre (Rosa micrantha), tomilho (thymus vulgaris), dorycnium (Dorycnium pentaphyllum), zarza (Rubus ulmifolius), agracejo (berberis vulgaris), enebro (juniperus communis) e lavanda (lavandula latifolia). O estrato herbáceo era dominado por gramíneas perenes (Brachypodium pinnatum, B. retusum, Festuca arundinacea, etc.) enquanto que, em poucas unidades, encontravam-se graminóides e herbáceas de folha larga.
Uma área de 1,8 ha foi cercada e dividida em duas partes iguais destinadas ao estudo de duas densidades de carga com 9 e 18 cabras/ha, respectivamente. Cada uma destas partes foi dividida em duas a fim de que os pastoreios na primavera e outono fossem independentes. Para o aproveitamento destas zonas, utilizaram-se dois lotes de cabras adultas da raça Blanca Celtibérica, de peso médio de 42 kg. Durante a primavera, que tem início no final de maio (quando flora a aliaga), os animais se trasladaram para uma campina polífita até o início do pastoreio de outono (outubro). Ambos os pastoreios foram analisados durante seis semanas.
A estação do pastoreio (primavera, outono) sobre a forma de utilização da vegetação foi observada diante do comportamento dos animais. O tempo destinado ao pastoreio foi cerca de 8h30m em ambas as épocas. As cabras dedicaram 50% de seu tempo, na primavera, consumindo herbáceos, e 50% do tempo restante consumindo folhas de espécies lenhosas. A porcentagem do tempo de consumo de folhas, no entanto, diminuiu significativamente no pastoreio de outono (32%).
Das espécies arbustivas apresentadas, o buxo não foi consumido em nenhuma das épocas estudadas (provavelmente, devido à presença de alcalóides em suas folhas que parecem atuar como um mecanismo de defesa), enquanto que a aliaga foi consumida com avidez nas duas estações. O tempo destinado ao consumo de folhas da aliaga foi sempre muito superior em relação às outras espécies lenhosas, mesmo que se tenha reduzido significativamente do pastoreio de primavera (36%) ao de outono (19%).
Para facilitar a interpretação dos resultados, na análise estatística foram agrupados tomilho, lavanda e enebro em espécies aromáticas e rosa, zarza, endrino e agracejo no grupo denominado espinhosas. O tempo durante o pastoreio de primavera, no consumo de espinhosas, reduziu-se significativamente no outono. Por outro lado, o tempo destinado ao pastoreio das espécies aromáticas aumentou nesta mesma estação. A densidade de carga, no entanto, afetou em menor magnitude a distribuição do tempo de pastoreio na seleção dos diferentes grupos vegetais. Apenas o grupo constituído pelas espécies espinhosas foi afetado por este parâmetro ao aumentar significativamente o tempo de consumo com a densidade de carga, como conseqüência do aumento no tempo destinado ao consumo de rosal.
O comportamento das cabras na seleção da dieta colocou em discussão a estação de pastoreio sobre o tempo destinado ao consumo de lenhosas, que passou de 50% na primavera e 32% no outono, enquanto que a densidade de carga sobre a utilização dos diferentes grupos vegetais foi menos evidente. A estação de pastoreio sobre a utilização dos distintos componentes da vegetação foi também observado por outros autores relacionando-se com a disponibilidade forrageira ou a variação de seu valor nutritivo.
Quanto ao consumo de folhas de aliaga, os animais dedicaram 36,5% do tempo de pastoreio durante a primavera. Isso se deve à densidade do arbusto e à qualidade nutritiva de seus brotos. As diferenças de tempo que os animais destinaram ao consumir o arbusto, entre ambas as estações de pastoreio, poderiam sugerir uma menor aceitabilidade da aliaga no outono, relacionada com a redução de seu valor nutritivo ou com o endurecimento dos brotos.
As observações realizadas sobre esta espécie revelaram uma redução significativamente superior ao seu volume nas áreas pastadas no outono, o que sugere que o tempo destinado ao pastoreio de uma espécie nem sempre é indicativo do nível de impacto exercido sobre ela. Dentro dos grupos vegetais considerados, a redução do valor nutritivo das espinhosas poderia explicar o menor tempo destinado ao consumo durante o outono. O escasso nível de consumo observado nas espécies aromáticas, durante a primavera parece estar mais relacionado ao elevado conteúdo nos compostos do metabolismo secundário do que por seus bons efeitos sobre o metabolismo hepático, a flora ruminal ou características organolépticas, que poderiam reduzir a aceitabilidade destas plantas. O menor conteúdo em óleos essenciais durante o outono também explica, em conseqüência, a maior proporção de tempo destinada ao seu consumo nessa época.
A modificação constatada na forma de as cabras utilizarem determinadas espécies vegetais com a estação do ano mostrou-se como instrumento eficaz de manejo em áreas florestais e caprinos.
Torrano L. e Valderràbano J. são do Serviço de Investigação Agroalimentar - D.G.A.,em Zaragoza (Espanha). Título original: Capacidade de utilização de zonas florestais pelo caprino.
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