Página Inicial BUSCA no site












Estaremos em recesso no perí¯¤o de 21 de Dezembro a 10 de Janeiro.
Os pedidos realizados nesse perí¯¤o ser㯠processados apã³ essa data.

Feliz Natal e um Prã³°ero Ano Novo!


Matérias



Não gritou mesmo!

- 01/02/2007

Todo mundo sabia que o coronel Ca­­ló­geras adorava o avião teco-teco da fazenda. Vivia fazendo piruetas sobre o povoado, para mostrar que era ca­bra macho, mesmo.

 

Um dia, o capataz percebeu que o bo­­de famoso, xodó do coronel, o bem-amado da redondeza, com agenda lota­da de cobrição, estava molengan­do, não queria nem assuntar as ca­bri­tas lin­do­nas e foi dizer para o coronel que vi­nha pela frente um futuro sem crias, pois o bode perdera o prumo de ­macho. O coronel nem pestanejou: achou por bem colocar o bode nas comandas de um doutor de branco. Foi assim que Be­larmino, todo enjalecado, chegou da ca­pital, depois de uma viagem terrível, em­poeirada e sacolejante.

 

Chegou-se ao bode, olhou, apalpou, perscrutou, analisou, mediu, conferiu e deu a sentença:

 

- Coronel, temos que levar o bode pa­ra a clínica, pra uma internação. Vai fi­car bom, mas precisa de tratamento acom­panhado o tempo todo.

 

O coronel tinha lá seus bons motivos para ir até a capital e aproveitou:

 

- Pois bem, doutor, vamos os três no avião: vosmecê, eu e o bode.

 

O coronel não viu, mas o veterinário se benzeu, por trás, pois tinha ­pavor de avião.

 

Não demorou muito e uma caixa im­provisada de ma­deira ficou pronta, para caber o bode, pois solto é que ele não podia ir dentro do avião. Nem preci­sou tran­ca, pois o bode estava mo­lei­rão, só querendo dormir. O veterinário Belarmino tremia de medo só de ­pensar em entrar num avião­zinho mixuruco, com um doido como o coronel, mas não tinha como fa­zer desfeita pra homem tão importante.

 

Num piscar de olho, estava o avião já ganhando as alturas, quando o coro­nel tentou acalmar o veterinário e, ao mesmo tempo, pregar uma lição de co­ra­­gem:

 

- Ô, seu Belarmino, vamos fazer uma aposta? Eu pago o dobro da sua con­­sulta, se vosmecê não gritar com as cambalhotas que eu vou fazer no ar!

 

O pobre veterinário não teve nem tempo de responder, pois o avião já de­ra uma guinada para cima, ­encolhendo o estômago do infeliz. Arregalou os olhos e o avião já despencava, dando um nó na garganta. Belarmino só pensava: “Acho que vou despregar as tripas”.

 

O coronel foi se entusiasmando com a brincadeira:

 

- Eita homem corajoso. Não é que não grita, mesmo! Pois vamos a uma li­ção mais avançada.

 

O avião girava, girocorcovava, pa­rafusava, retorcia, empinava, corcovea­va, e nada! Belarmino, coi­tado! Não ti­nha nem um fiapo de voz para mugir. O juízo já havia ficado na última camba­lhota.

 

O homem não gritava e o coronel per­cebeu que podia perder a aposta. Tratou de exibir toda sua sa­bença no comando do te­co-teco, brincando ­perto das nuvens, descendo até per­tinho do chão, fazendo as tripas de Belarmino descerem até o joelho, subirem até o gogó, enquanto ia mu­dando de cor: ficou lilás, ficou verde, ficou negro e, no fim, estava azulado, esbugalhado, arrasado.

 

O coronel virou para trás, viu o lamentável veterinário, caquético, troncho, fazendo gestos com as mãos, doidamente. O coronel riu. Na certa, Be­lar­mino havia pirado e estrebuchava pe­los olhos.

 

Não durou muito e o coronel concordou que perdeu, pela primeira vez, uma aposta em sua vida. Nunca tinha encontrado alguém tão teimoso, pois es­tava na cara que o pobre Belarmino queria gritar, mas a voz é que não saía. As lágrimas estavam na beirinha, mas não saíam; a boca abria mas nem sussurrava; tudo era um susto só.

 

O coronel deu-se por vencido, depois de tantas piruetas no céu, aterrissou na capital, agora como piloto bem comportado e traquinou com o veterinário:

 

- Tá bom, você ganhou a aposta, não gritou mesmo. Mas diga aí: teve umas horas bem difíceis que você queria gritar, não teve?

 

O infeliz balançava a cabeça, concordando, segurando o almoço que es­tava insistindo para voltar para a boca.

 

- Ah! Eu bem sabia que ninguém podia aguentar tudo aquilo. Mas, bem que você quis gritar, não é mesmo? Diga aí: qual foi o momento em que vo­cê mais quis gritar?

 

Belarmino tentou se ajeitar, desa­mas­­sou o jaleco, desengasgou, ­engoliu ar, arregalou os olhos, quase arrependido, e sussurrou, num fio de voz:

 

- Foi... quando eu tentava avisar... que o bode tinha caído...

 






Link para esta p᧩na: http://www.revistaberro.com.br/?pages=materias/ler&id=220


Desenvolvido por Spring
rea do usuᲩo

 
Cadastre-se para acessar as mat鲩as restritas, clique aqui.

Esqueci minha senha!