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Matérias



Bom de quenga

- 06/03/2012

Zé Rufino era mulherengo, conhecido em prosa e verso pelos casos envolvendo sua pessoa nas feiras de domingo; era pobre como rato de igreja, mas tão mentiroso que a todos emprenhava como se tivesse o creio-em-deus-pai na ponta da língua. Se avistava uma mulher-dama diferente no pedaço, já logo começava a desfiar o verbo, acreditando num estatelar de luxurice no recostado de algum muro escondidinho.

No domingo de Páscoa, povoado cheio de filhas e netas que uma vez por ano comparecem para pedir a bênção de mãe e avó, Zé Rufino botou a melhor camisa, calçou a bota engraxada, reluzindo mais que raio-na-serra e se achegou ao curral. Escovou a cabrita campeã do terreiro, alisou e colocou a coleira trançada de campeã e sussurrou:

- Eita, bichinha, minha santa inspiração! Tá mais enfeitada que penteadeira de rapariga. Hoje vamos conquistar a melhor moça do mundo.

Empinou o chapelão de gente rica que havia caído, certa vez, de uma caminhonete, e se apressou para o festejo, em seu carro velho, sujo e amassado.

Na feira, gastou muitos trocados com uísque cansado-de-guerra, para esnobar as moças que só tinham olho para o chapelão vistoso, as rosetas e coleira da cabrita que ficava na corda, alimentada com alface do bem-bom. E logo a mulherada-da-vida estava se arrastando e se afoitando:

- Ah! - bem que eu gostaria do endereço dessa linda cabritinha.

- Nossa, Seu Rufino, que charmosa essa campeã. Ela não precisa de uma camareira?

- Ôxa, homem, se a cabrita quiser umas aulas de perfumice, estou às ordens.

- Em caso de precisão, tem uma xerifa bem aqui.

Com o vapor etílico subindo nas grimpas, Seu Rufino escorregava das cantadas como peba em areia frouxa, com um sorriso de sim-sim-não-sim:

- Deixe disso, minha fulô, que a cabrita já tem futuro escrito. Só está aqui de passeio.

 

 

 

 

Os homens morriam de inveja, pois qualquer moça só tinha olhares para o mulherengo que parecia ser o melhor partido do mundo. Não havia dúvida, Zé Rufino posava de última cerveja do churrasco, o mel na chupeta de criança, mas sabia elogiar uma dama, com conversa direita como boca de bode que, mesmo sem entender, as moças gostavam.

No almoço, comilança geral, com amontoado de moças disputando a primazia do chapelão, disputando lugar para colocar verdura na boca da cabrita. Nas quatro-horas continuava a bebedeira e amassos-mil, aproveitando a soneca da cabrita, em meio aos que desarrumavam as madeiras para ir montar barraco no povoado vizinho. O dia sumiu, a noitinha chegou, Zé Rufino, olhos inchados, de cara-cheia já chamando urubu de meu-louro, estava mais melado que espinhaço de pão-doce, percebeu que tinha que se livrar das três morenas desejosas de um veredito:

- Diga aí, Rufino, qual de nós três é a sua preferida?

O espertalhão pensou e destilou a resposta cheia de poesia:

- São três, mas com beleza para seis. Se puder, eu fico com as sete, que é o número da maravilha.

A seguir, meio cambaleando, Zé Rufino foi estendendo os passos em direção à saída, empinando o chapelão. As moças ficaram ouriçadas, pois o ricaço iria, afinal, meter a mão no bolso, antes mesmo das caladas da noite. Com certeza, haveria uma boa grana para as três e pouco serviço pois o bêbado já estava quase desabando.

 

 

 

 

Rufino chegou ao estacionamento, passou perto das caminhonetes luxuosas. As moças arregalavam os olhos, pensando ter chegado ao destino, mas nada! - o homem continuava andando. Passou a caminhoneta do prefeito, do vereador, do deputado. Passou pelos carros, pelas motos e chegou, lá no final do estacionamento, a uma carroça atrelada a um burro nada amigável pelo escuro da noite. Seu Rufino nem pestanejou, conversou com o burro, colocou a cabrita no canto seguro da carroça, subiu, pegou a rédea e comandou:

- Vamos embora, minha gente, que essa é a melhor condução do mundo.

As moças, depois de ter gasto a tarde inteira, esperando o momento de meter a mão numa grana, revoltaram-se:

- Credo em cruz, Seu Rufino, que presepada é essa? Andar numa carroça? Isso é coisa do Cão!

Seu Rufino, acostumado a dar rasteira em cobra, já enxergando tudo dobrado, deu o veredito:

- Ué, dona moça, sou o homem mais liso do mundo, pior que quiabo em boca de velho, mas toda gente sabe que homem de carroça é que faz bom serviço.

As moças revoltaram-se:

- Ôxa, homem, depois dessa desfeita não há de quem fazer bom serviço, mesmo!

As três empinaram o beiço e, vendo que o caviar virara sopa, se apressaram de volta para a feira, para tentar alguém disposto a um resto de boa noitada.

Seu Rufino fez cara de coitado, de desprezado, desceu da carroça, abraçou a cabrita, e cochichou com o burro:

- Eita mulherada doida, não é, amigão?

Num último esforço, chegou à velha caminhonete, aboletou a cabrita e se deitou disposto a ficar até o sol rachar no céu.

 

Você sabe o que é “quenga”? - É o casquilho do coco, utilizado para receber toda sorte de doces, no Nordeste. A palavra “quenga” é utilizada para indicar uma “piranha” (prostituta), indicando a moça que, como o casquilho de coco, se dispõe a receber toda sorte de guloseimas.

 






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