Por uma semana, o Brasil brilhou no mundo, reunindo grandes especialistas para demonstrar o andamento da caprinocultura em todos os países.
Detentora de 91% do rebanho de caprinos do país, a região Nordeste ganhou importância no cenário mundial para o desenvolvimento da caprinocultura como oportunidade de negócio e prosperidade social. Foi o que evidenciou a 10ª Conferência Internacional de Caprinos (IGA 2010), em Recife (PE), com a palestra “Desenvolvimento na criação de pequenos ruminantes para alcançar os objetivos do milênio” com o pesquisador Antonio Rota (IFAD), de Roma.
A Conferência Internacional sobre Caprinos é promovida pela International Goat Association (IGA), associação sem fins lucrativos, cuja missão é promover a pesquisa e desenvolvimento da caprinocultura para o benefício da humanidade, melhorando a qualidade de vida das pessoas em todos os países.
O evento, que se realiza a cada quatro anos e não acontecia no Brasil desde 1987, incluiu simpósios, palestras, cursos, fóruns e debates com cientistas, técnicos e criadores dos cinco continentes. Na oportunidade foi realizado um Festival Gastronômico de diversos cortes de caprinos, também um Desfile de Moda e mais uma Mostra de Produtos Derivados da caprinocultura. Aproveitando a ocasião, foi realizada uma megarreunião com as entidades que formam o Aprisco Nordeste e outra da Câmara Setorial da Caprino-Ovinocultura.
A professora Maria Norma Ribeiro, membro da diretoria da IGA e do Comitê Executivo do evento, ressaltou que a preocupação dos organizadores foi buscar meios para impulsionar a caprinocultura, devido à sua importância econômica e social em regiões semiáridas do mundo inteiro. "Muitos países possuem áreas onde as condições climáticas dificultam a exploração agrícola e os caprinos representam uma atividade muito relevante, devido à sua aptidão para produzir leite e carne a baixo custo, além de servir como fonte de renda, por meio da produção de peles" - assegura.
Para o diretor do Instituto Nacional do Semiárido (INSA), Roberto Germano Costa, “é perceptível a importância econômica e social da caprinocultura no semiárido nordestino, onde as condições climáticas dificultam a exploração agrícola de culturas tradicionais”.
“Pelo tamanho do rebanho, a atividade na Região já consolidou sua importância e viabilidade e começa a despertar o interesse de criadores com visão empresarial. Atualmente, a importância econômica e social dos caprinos criados no Nordeste do Brasil reside na produção de leite e carne, para alimentação das populações de média e baixa rendas, como fonte de proteína animal de baixo custo, e na produção de peles, que é mais uma fonte de renda”, avalia Germano.
Mais importante que tudo é o fato de a caprinocultura brasileira existir há 500 anos como ferramenta eficaz de fixação do homem ao campo, com dignidade social pelo que produz.
De acordo com o IBGE, a região Nordeste concentra mais de 91% do rebanho do país. Os estados da Bahia e Pernambuco lideram em número de cabeças. A Paraíba detém o quinto maior rebanho, mas registra a maior produção de leite do país (18 mil litros/dia).
O gestor do projeto Aprisco Nordeste e superintendente do Sebrae/Paraíba, Luiz Alberto Amorim, diz que a realização da 10ª Conferência Internacional de Caprinos é mais um evento internacional que acontece na região para somar na intensificação de intercâmbio global, apontando tendências, experiências e pesquisas do setor dos últimos anos.
“No ano passado, realizamos o 4º Simpósio Internacional sobre Caprinos e Ovinos de Corte (Sincorte) em João Pessoa, que contou com a presença de renomados técnicos nacionais e internacionais, empresários e produtores da área. No mês de junho deste ano, o Sebrae Nacional em parceria com o Projeto Aprisco Nordeste enviou 22 pessoas entre técnicos e representantes de entidades à Espanha e Portugal para conhecer as práticas e experiências bem sucedidas da caprino-ovinocultura nesses dois países”.
IGA é um evento mundial que chega ao Brasil e, particularmente, ao Nordeste por meio do esforço integrado do projeto Aprisco, Sebrae, INSA e da UFPE Rural, o que demonstra força de articulação das entidades na região.
Para Luiz Alberto, a IGA chegou no momento oportuno, quando o Aprisco começa a articular o desenvolvimento sustentável e integrado da caprino-ovinocultura nos nove estados do Nordeste. “O evento tem muito a ver com o horizonte que queremos da caprinocultura na região: uma atividade economicamente sustentável, ambientalmente correta e conectada com o Brasil e o mundo dentro de um contexto de mercado, pois vivemos – queiramos ou não – numa economia globalizada”, lembrou Luiz Amorim.
O pesquisador da Emepa-PB, Wandrick Hauss, também presidente da SBMA, diz que existem três desafios para serem vencidos e, depois disso, então, dentro de uma década, a caprinocultura poderá se transformar numa atividade econômica relevante para a Região Nordeste. Os desafios são:
1) os proprietários de estabelecimentos rurais precisam avançar na gestão do segmento e tratar a caprinocultura como um negócio;
2) incorporar os avanços tecnológicos como ferramenta para elevar a produtividade;
3) melhorar sua competitividade, agregando valor aos produtos. Para tanto, além de manter e melhorar a caprino-ovinocultura nos moldes tradicionais sertanejos, também é premente a necessidade de incrementar o modelo de produção em alta escala, de forma a regularizar e oferecer segurança ao mercado, ampliando assim sua eficiência”, apontou Hauss.
Cartilha do Semiárido
No dia 22, durante a 10ª Conferência Internacional de Caprinos (IGA) foi lançada a cartilha Agricultura Agroflorestal e Criação Animal no Semiárido. A cartilha é resultado de oficinas realizadas com produtores rurais do Semiárido pernambucano que desenvolvem agricultura agroflorestal e criam animais de pequeno porte. A publicação vem alimentar os conhecimentos sobre as práticas agrícolas e a criação de animais por agricultores da região a partir dos princípios da agroecologia.
Traz informações sobre a região semiárida, orientações sobre produção de forragens e implantação de sistemas agroflorestais no Semiárido, na perspectiva de contribuir com a sustentabilidade das propriedades rurais familiares e com a biodiversidade
Dentre os palestrantes internacionais destacaram-se:
u o pesquisador da Universidade da Geórgia (EUA), Dr. Corrie Brown, que falou sobre doenças de caprinos e seus impactos econômicos;
u o pesquisador da Macaulay Land Use Research Institute, do Reino Unido; Dr. Robert Orskov, responsável pelo aprimoramento da metodologia de avaliação de alimentos usada até hoje, que ressaltou os novos desafios na alimentação de pequenos ruminantes para países em desenvolvimento;
u a pesquisadora da Universidade de Recursos Naturais e Ciências Aplicadas, BOKU (Áustria), Dra. Maria Wurzinger, que ministrou palestra sobre estratégias de melhoramento baseadas no conhecimento dos pequenos produtores;
u o presidente da IGA, Dr. Jean Paul Dubeuf, que falou sobre o tema Diversidade e Desafios da Caprinocultura para pequenos produtores ao redor do mundo.
Além desses nomes, o evento contou com a presença de representantes do Instituto Internacional de Pesquisas Florestais, Agrícolas e Pecuárias (INIFAP), do México, e da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO).
Como avançar?
Em entrevista para Renata Saturnino, da revista O Berro, Roberto Germano, presidente do INSA - Instituto Nacional do Semiárido, evidenciou que - com mais quatro instituições formou-se o Comitê Executivo da IGA 2010. Também o Ministério de Ciência e Tecnologia participou do evento, com recursos. “Isso foi importante, pois a IGA é a única entidade que congrega as atividades da caprinocultura no mundo. Depois de 25 anos, trouxemos a IGA para o Brasil, pela 2a. vez. A primeira vez foi em Brasília e, agora, no centro do maior polo criador brasileiro, Recife.
Sobre os avanços em carne, leite, pele e esterco, Germano lembra que é preciso mais tecnologia para que os produtos cheguem com segurança à mesa do consumidor. “Temos muito que avançar no Brasil, uma vez que todo leite produzido ainda é consumido em forma fluida, na maior parte. Temos experiência maravilhosa na Paraíba, onde havia o mais baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e que, agora, com leite de cabra, foi possível resgatar a dignidade social das populações. As pessoas estão voltando para a região, pois a criação de caprinos tornou-se sustentável”. A carne também vem aumentando de consumo nas grandes cidades. Fortaleza, que consumia 100 g/ano já chega a 1.500 kg: para cada 10 espetos, hoje 2 já são de carne caprina ou ovina. A população está tomando consciência da importância da carne caprina.
Se a carne vai bem, como está a produção de leite? “A questão do preconceito ainda é muito forte” - diz Germano. É preciso mostrar tecnologia e esclarecer que, cientificamente, o leite consumido pode vir de duas fábricas diferentes: vaca e cabra, cada uma com suas qualidades próprias. O leite de cabra tem muitas vantagens. A principal é apresentar glóbulos menores, sendo mais saudável para crianças e idosos. Depois, é preciso voltar-se para o processamento para agregar valor.
Ousadamente, Germano insiste: “quando o Brasil tiver tecnologia para queijo de qualidade, não haverá França que se segure com a capacidade de produção do nosso país. As boas experiências, como a do Cariri Paraibano, precisam se multiplicar, consolidando políticas públicas, pois a atividade é capaz de melhorar as pequenas propriedades, principalmente em áreas semiáridas, degradadas, empobrecidas”. Este potencial pode ser muito ampliado, aumentando o rebanho, especializando nas produções de carne e leite.
O INSA, presidido por Roberto Germano, tem função básica de articular os agentes locais do desenvolvimento, juntando os elos tecnológicos tendo em vista disseminar, preservar e melhor utilizar as raças nativas.
E qual o papel da revista O Berro? O mesmo Roberto Germano responde: “Quando sequer havia uma atividade articulada, no Nordeste, o visionário escritor Rinaldo dos Santos, percorrendo os sertões, começou a mostrar, em publicações, a importância econômica da atividade. A revista é um órgão maravilhoso para a atividade, sem dúvida está entre as melhores do mundo, se não for a melhor. A revista sempre demonstrou interação com o produtor, estando presente nos principais eventos. A revista sempre esteve de parabéns, pois - além de uma bússola segura - também pode-se afirmar que é parte da alma da própria atividade.
Cabra: um papel mundial
Christian de Vreies, salientou a Importância do evento: “o papel da IGA é divulgar caprinos, ovinos, pequenos ruminantes, para público, estudantes, produtores, etc. Assim, está sempre promovendo intercâmbios noticiosos. O Brasil vem apresentando alta qualidade nas pesquisas. Na IGA 2008, no México, ficou evidenciado que a produção científica do Brasil era muito boa. Muitos se entusiasmaram e deixaram claro que gostariam de conhecer o que está sendo feito no Brasil. Por isso, este evento tem países importantes para pequenos ruminantes, como a China, México, Espanha, Alemanha, Estados Unidos, Inglaterra, Austrália, Nova Zelândia, e outros. Aqui o objetivo é recolher e trocar informações”.
Quanto ao evento, De Vreies deixou claro que tudo correu muito bem, sendo mais um notável ponto para a IGA. “Os brasileiros estão de parabéns” - concluiu.
O Berro ouviu, também, Hector Andrade, que salientou a importância do evento mundial, com repercussão nos quatro cantos do planeta.
“Não se trata apenas de um pequeno ruminante; o caprino não é apenas um animal, ele é muito mais que isso: é uma ferramenta econômica para famílias no mundo inteiro. Estou muito contente por este evento aqui no Brasil, pois é muito evidente a luta pela caprinocultura como ferramenta econômica, como insumo que garante dignidade ao produtor rural. Até hoje eu sabia que a cabra produzia leite, carne, pele, estrume, e muitas outras coisas, mas não havia visto uma ênfase à dignidade. A cabra produz dignidade para o homem sertanejo - isso é fantástico, revolucionário! A revista O Berro está de parabéns por essa posição destemida a favor da caprino-ovinocultura.
Muita gente no maior evento sobre caprinos.
Cursos, palestras, fóruns.
Bom atendimento, cordialidade.
Ambiente requintado marcou o evento.
Desfile de Moda em couro.
Este evento é muito importante, pois é um intercâmbio intenso que chega a milhares de pessoas, via Internet e outros meios eletrônicos. Os resultados, com certeza, serão muito bons. O mundo inteiro está aqui, no Brasil, para mostrar a importância da cabra como produtora de moeda, é uma caixa-forte, por meio do leite, carne, pele e muitos outros produtos.
Brasil e México são países irmãos, com zonas semiáridas. O México tem 60% no semiárido; o Brasil pouco mais de 20%. A troca de informações entre Brasil e México é muito importante. No México, como em outros países, milhões de famílias vivem da cabra. Qualquer projeto realizado em qualquer país é sempre muito importante para o semiárido.
Hector salienta que a cabra está muito visível no Nordeste brasileiro, havendo uma posição definida de alguns governos que promovem o crescimento da produção leiteira.
A Paraíba é o maior exemplo, pois o Governo firmou uma Lei para comprar 30.000 litros/dia, mesmo sem ter essa produção, por enquanto. Os paraibanos, agora, estão tratando de aumentar sua produção, já que existe uma Lei para comprar o produto.
No Nordeste, portanto, a cabra faz parte da economia e é ferramenta de sobrevivência na terra. No México, ainda a cabra não é levada muito em conta, mas já soma 4% do leite produzido. Vem melhorando muito no México, podendo aumentar o intercâmbio com o Brasil. Em outros países cresce a tecnologia com queijos e produtos diversos antialergênicos.
Hector Andrade observa que, no Brasil, tem havido muita preocupação com genética e alta tecnologia, principalmente nos grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro.
Há também muita atividade em outras regiões, em busca de animais rústicos e lucrativos. A carne apresentada para consumo, no entanto, ainda é muito do tipo “assado”, já evoluindo para outras receitas. É fácil verificar que, logo mais, o Brasil será a potência da caprino-ovinocultura mundial, como já é dos bovinos.
Publicação
Os melhores trabalhos científicos apresentados no evento serão publicados na revista da IGA, a “Small Ruminant Research”, que tem ampla circulação internacional.
Conclusão
A pesquisadora Maria Norma Ribeiro concluiu que a IGA atingiu seus objetivos técnico-científicos e sociais. “Já se percebe uma sinergia muito positiva gerada a partir das parcerias firmadas na realização do evento. A curto e médio prazos os resultados serão excelentes” - garante.
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